#02 Oliver indica - Mistérios da Carne (Mysterious Skin, 2004)
Um filme impossível de esquecer — e que talvez nem devesse ser esquecido
Olá, cinéfilos e buscadores de histórias que realmente mexem com a gente.
Hoje a recomendação não é leve. Mas é urgente
Mistérios da Carne (Mysterious Skin, de Gregg Araki) não é um filme para ser “curtido” no fim do dia, nem para te distrair dos problemas. Ele é, antes de tudo, um mergulho corajoso — e doloroso — na forma como o trauma molda vidas. Um daqueles filmes que incomodam porque se recusam a desviar o olhar. E justamente por isso, é uma das experiências cinematográficas mais fortes que você vai ter.
Duas infâncias, dois caminhos — uma dor em comum
O enredo acompanha dois garotos, Brian (Brady Corbet) e Neil (Joseph Gordon-Levitt), ligados por um mesmo evento traumático, mas que seguiram trajetórias completamente diferentes para lidar com o que viveram.
Brian é introspectivo, tímido, vive com lapsos de memória e está convencido de que foi abduzido por alienígenas. Neil, por outro lado, mergulha em uma jornada autodestrutiva: ainda na adolescência, se envolve com prostituição e relações perigosas. O que os une é invisível aos olhos no início — mas se revela com uma força devastadora à medida que o filme avança.
O brilhantismo do roteiro está justamente nessa dualidade. Mysterious Skin não te entrega respostas de bandeja. Ele exige que você sinta junto. Que caminhe com esses personagens, mesmo que desconfortavelmente, até a revelação final. E quando ela vem, não há volta. É o tipo de dor que permanece.
Atuações que doem (no melhor sentido da palavra)
Joseph Gordon-Levitt entrega aqui talvez a atuação mais intensa de sua carreira. Ele se despe de qualquer vaidade para dar vida a Neil, um personagem frio, distante, que guarda a dor nas entrelinhas. A entrega é tão crua que chega a incomodar — e é justamente isso que o torna tão real.
Já Brady Corbet como Brian carrega uma vulnerabilidade rara. Você sente o peso da confusão, da inocência perdida, da tentativa desesperada de entender algo que o cérebro bloqueou por puro instinto de sobrevivência.
Ambos estão em um nível de entrega que transcende o naturalismo. Não há exageros. Não há alívio cômico. Não há nada gratuito. Cada cena tem um motivo para existir — e você sente isso no corpo.
Um filme necessário, mas não fácil
Não se engane: Mysterious Skin é um soco no estômago. Trata de abuso sexual infantil com uma honestidade brutal — sem romantizações, sem alívios. Mas o faz com respeito. Com sensibilidade. É um filme que entende o poder do silêncio, da sugestão, da dor não verbalizada.
É uma experiência que exige preparo emocional, sim. Mas é também um lembrete sobre a importância de escutar histórias difíceis. Sobre como o trauma age de forma diferente em cada pessoa. E, sobretudo, sobre como a arte pode ser um instrumento para iluminar as feridas mais profundas — não para nos confortar, mas para nos transformar.
Onde assistir?
Você pode encontrar Mysterious Skin para aluguel ou compra no YouTube, Apple TV ou Google Play. Recomendamos ver com fones, em silêncio, com tempo para digerir depois.
Vou deixar um drive também com o filme para vocês > assista aqui
Para refletir depois da sessão:
O que o filme diz sobre a maneira como lidamos com memórias traumáticas?
Como a linguagem corporal dos personagens comunica o que eles não conseguem verbalizar?
Existe redenção ou apenas entendimento?
Se você já assistiu, me conta: como Mysterious Skin te afetou?
E se ainda não viu, prepare-se. Alguns filmes não passam — eles ficam. Este é um deles.
Até a próxima sessão,
Pipoca & Café